01/08/08

Peixes prisioneiros

“Eu achava que a lama me fora dada para gozar as belezas do mundo, a luz do luar na alaranjada crista de uma nuvem e a gota de orvalho que estremece em cima de uma rosa. Mas enquanto fui criança, pensei sempre que a vida me reservava um acontecimento sublime e belo. Mas à medida que analisava a vida dos outros homens, descobri que viviam aborrecidos, como se vivessem num país onde chove sempre, onde os raios da chuva lhes deixaram no fundo das pupilas tabiques de água que lhes deformavam a visão das coisas. E compreendi que as almas se moviam na terra como os peixes prisioneiros num aquário. Do outro lado das esverdeadas paredes de vidro estava a bela vida musical e altíssima e onde tudo seria distinto, forte e múltiplo e onde os novos seres de uma criação mais perfeita, com os seus belos corpos, saltariam numa atmosfera elástica. Nessa altura dizia-me: “É inútil, tenho de fugir da terra”.

Roberto Arlt, Os sete loucos, (Trad. Rui Lagartinho e Sofia Castro Rodrigues), cavalo de ferro

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